Com a entrada em vigor da Lei 13.874/19, resultante da conversão da chamada Medida Provisória da Liberdade Econômica (MP 881/2019), tornou-se possível a constituição de Sociedade Limitada Unipessoal (SLU), permitindo que uma única pessoa figure como sócia de uma sociedade limitada.
Antes dessa mudança, a legislação exigia ao menos dois sócios para a constituição de uma sociedade limitada, o que muitas vezes levava o empreendedor a incluir familiares ou pessoas próximas no contrato social apenas para cumprir uma formalidade legal, sem que essas tivessem participação efetiva no negócio.
Ao contrário das sociedades com múltiplos sócios, nas quais a falta de um deles geralmente não impede a continuidade da empresa, na sociedade unipessoal o falecimento do único sócio pode representar um ponto crítico. Isso porque a pessoa jurídica, embora distinta da pessoa física, depende diretamente da figura do sócio único para sua existência e administração.
Na ausência de um planejamento sucessório prévio, no caso de falta do sócio, a operação da empresa pode ficar comprometida, sem representante legal com poderes para movimentar contas, assinar contratos ou tomar decisões administrativas. Além disso, as quotas da empresa passam a integrar o espólio e estarão sujeitas ao processo de inventário, que pode ser longo, oneroso e burocrático.
Pensando na fluidez e continuidade dos negócios, algumas providências podem e devem ser adotadas. A primeira delas – aplicável a qualquer empresa – é a revisão das cláusulas constantes no contrato social, documento constitutivo da empresa, que muitas vezes não traz previsões claras sobre sucessão ou incapacidade do(s) sócio(s). É recomendável, portanto, incluir cláusulas específicas prevendo a continuidade da sociedade com os herdeiros, a nomeação de administrador provisório em caso de falecimento ou incapacidade, critérios para avaliação das quotas, entre outras.
Outra medida importante para a sociedade unipessoal é a constituição de uma procuração específica (mandato societário), por meio da qual a própria pessoa jurídica outorga poderes a terceiro de confiança, para que este possa representá-la e praticar atos jurídicos em seu nome, temporariamente, em casos de emergência. A validade desse mandato depende da existência da pessoa jurídica, e não da figura do sócio em si, portanto pode ser utilizada mesmo após o falecimento do único sócio. É uma estratégia que visa garantir a continuidade da sociedade, pelo menos nos trâmites mais imediatos, até que se estabeleça um administrador definitivo ou se defina o destino da sociedade.
O testamento também é um instrumento eficaz, permitindo ao sócio nomear um administrador provisório para conduzir a empresa por determinado período, inclusive com a incumbência de preparar os herdeiros para a futura gestão. Além disso, é possível condicionar o recebimento das cotas sociais a requisitos como a realização de um curso de especialização, dentre outras exigências.
Outra alternativa viável é a constituição de uma holding patrimonial, na qual a sociedade unipessoal passa a integrar a holding como um ativo. Os herdeiros tornam-se sócios da holding, e a sucessão ocorre internamente, mediante governança previamente definida por acordo de sócios ou protocolo familiar.
É de suma importância que o empresário compreenda o impacto do falecimento, incapacidade, divórcio e outras questões familiares que possam impactar nos negócios. A ausência de previsões adequadas e da preparação estratégica de um sucessor pode levar à paralisação das atividades empresariais, bloqueio de contas bancárias, disputas entre herdeiros e até mesmo à dissolução da sociedade. Por essa razão, buscar orientação jurídica especializada e elaborar um planejamento sucessório personalizado é essencial para garantir a sustentabilidade do negócio e da família em situações sensíveis e desafiadores.
Liamara Reis. OAB/RS 87.377