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O que acontece com as quotas sociais após o falecimento do sócio?

O que acontece com as quotas sociais após o falecimento do sócio?

No momento da constituição de uma sociedade, é comum que os sócios concentrem suas atenções na operação empresarial. Porém, questões sensíveis, como o que acontecerá em caso de falecimento, divórcio ou incapacidade de um dos sócios, raramente são discutidas nessa fase inicial. O resultado disso é que, na ausência de previsão contratual, a sociedade fica vulnerável a conflitos e inseguranças justamente em momentos de maior fragilidade emocional e patrimonial.

Quando ocorre o falecimento de um sócio, automaticamente abre-se a sua sucessão. Isso significa que o inventário – judicial ou extrajudicial – irá apurar o patrimônio do falecido, incluindo suas quotas sociais na empresa. Neste momento, surgem perguntas como: Os herdeiros entram automaticamente na sociedade no lugar do sócio falecido? Como é feita a avaliação das quotas? Os demais sócios são obrigados a aceitar os herdeiros como sócios? O contrato social pode limitar ou regulamentar essa entrada de herdeiros?

A resposta para todas essas perguntas vai depender do que está previsto no contrato social e acordos parassociais.

O Código Civil, no art. 1.028[1] estabelece que, em caso de falecimento de sócio as suas quotas serão liquidadas, mediante pagamento do valor correspondente aos herdeiros, salvo se o contrato tiver outra disposição, se os sócios remanescentes optarem pela dissolução da sociedade ou, se houver acordo entre os sócios ou previsão contratual, a sociedade continuar com os herdeiros.

Ou seja, na falta de disposição no contrato, a regra geral é que os herdeiros tenham direito à participação societária, mas não necessariamente ingressem na gestão da empresa.

Portanto, as quotas sociais do sócio falecido irão integrar o inventário e caso não haja substituição pelos herdeiros na sociedade, os sucessores receberão o valor econômico correspondente à participação do falecido na empresa, situação que muitas vezes abre uma nova discussão: o critério para avaliação das quotas na apuração de haveres. De acordo com o caput do art. 1.031[2] do CC, combinado com o caput do art. 606[3] do CPC, a avaliação de quotas das sociedades regidas pelo Código Civil deve adotar o valor patrimonial, apurado em balanço patrimonial específico. No entanto, o método de avaliação muitas vezes gera discussão e interpretações distintas, o que pode resultar na apuração judicial de haveres.

Portanto, a ausência de regras claras no contrato social e até mesmo a falta de um acordo de sócios bem elaborado poderá prejudicar a continuidade da empresa em caso de falecimento, divórcio ou incapacidade de algum sócio. A ausência de cláusulas específicas sobre sucessão societária faz com que a empresa fique refém das regras previstas no Código Civil, o que nem sempre reflete a vontade dos sócios ou os interesses do próprio negócio.

Disputas judiciais envolvendo as quotas acabam gerando morosidade na partilha e finalização do inventário, assim como, podem prejudicar o andamento e gestão da empresa, uma vez que o inventariante poderá fiscalizar o andamento, exigir prestação de contas e distribuição de dividendos ao espólio enquanto a partilha não é perfectibilizada.

Nesse sentido, reitera-se a importância de revisão das cláusulas do contrato social, assim como a elaboração de um bom acordo de sócios, a fim de refletir a forma como os sócios gostariam que a sociedade fosse conduzida na ocorrência de falecimento, com regras de sucessão claras. É igualmente importante constar no contrato social como os haveres serão liquidados, ou seja, como as quotas serão avaliadas e forma de pagamento para que não inviabilize a continuidade da empresa, dentre outras questões que não importantes para a sustentabilidade do negócio.

A sucessão societária decorrente do falecimento de um sócio não deve ser tratada de forma improvisada, e um bom planejamento sucessório e societário com mecanismos preventivos pode evitar a exposição da sociedade e dos herdeiros a insegurança jurídica, litígios prolongados, dificuldade de gestão e risco de comprometimento da continuidade empresarial.

 

[1] Art. 1.028. No caso de morte de sócio, liquidar-se-á sua quota, salvo:

I – se o contrato dispuser diferentemente;

II – se os sócios remanescentes optarem pela dissolução da sociedade;

III – se, por acordo com os herdeiros, regular-se a substituição do sócio falecido.

[2] Art. 1.031. Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado.

[3] Art. 606. Em caso de omissão do contrato social, o juiz definirá, como critério de apuração de haveres, o valor patrimonial apurado em balanço de determinação, tomando-se por referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo também a ser apurado de igual forma.

Parágrafo único. Em todos os casos em que seja necessária a realização de perícia, a nomeação do perito recairá preferencialmente sobre especialista em avaliação de sociedades.

 

Liamara Reis,

OAB/RS 87.377,

Especialista em Direito de Família e Sucessões.

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