Introdução
A partir de 26 de maio de 2025, entra em vigor a nova redação da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), que disciplina as disposições gerais e o Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO) no ambiente de trabalho. Uma das principais alterações foi a obrigatoriedade de inclusão dos riscos psicossociais no Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), o que traz novos desafios jurídicos e operacionais para as empresas.
No primeiro ano de vigência, a norma terá apenas caráter orientativo e educativo, não havendo aplicação de multas por descumprimento das novas regras. A efetiva fiscalização e aplicação de penalidades terá início em maio de 2026.
Isso não significa que o descumprimento da norma não possa ser utilizado como base para ações trabalhistas e inspeções do Ministério do Trabalho. A ausência de medidas preventivas pode caracterizar conduta negligente do empregador, acarretando a responsabilidade da empresa em casos de reconhecimento de doenças ocupacionais e acidentes de trabalho. A jurisprudência atual já reconhece o dano existencial e moral decorrente de práticas organizacionais abusivas.
Por isso, é importante que as empresas vejam e utilizem este período como uma oportunidade para revisão e adaptação das políticas já existentes e para elaboração de novas diretrizes, já adequadas à nova legislação.
O que são riscos psicossociais?
Riscos psicossociais referem-se a aspectos da organização do trabalho, das relações interpessoais e das condições ambientais que podem causar danos à saúde mental e física dos trabalhadores. Incluem, por exemplo:
- Assédio moral ou sexual;
- Excesso de jornada ou metas abusivas;
- Mudanças organizacionais mal gerenciadas;
- Ambiente de trabalho hostil;
- Falta de clareza nas funções e comunicação ineficaz;
- Isolamento social ou discriminação;
- Insegurança quanto à estabilidade no emprego.
As obrigações legais das empresas
Com a nova NR-1, as empresas devem:
- Identificar e avaliar os riscos psicossociais de forma sistemática;
- Documentar esses riscos no PGR;
- Implementar medidas de prevenção e mitigação, como treinamentos, canais de denúncia, suporte psicológico e revisão de políticas internas;
- Integrar os riscos psicossociais à Avaliação de Riscos Ocupacionais, junto aos riscos físicos, químicos, biológicos e ergonômicos.
O descumprimento dessas obrigações pode gerar responsabilidade administrativa, cível e trabalhista, especialmente se for constatado nexo entre o ambiente organizacional e danos à saúde do trabalhador.
A importância de uma equipe multidisciplinar para o gerenciamento de riscos psicossociais
Diferentemente dos riscos físicos ou químicos, os riscos psicossociais envolvem fatores subjetivos e interdisciplinares, sendo essencial a atuação coordenada de profissionais de diferentes áreas. A abordagem multidisciplinar permite um diagnóstico mais preciso e soluções mais eficazes.
Os principais atores envolvidos são:
- Jurídico (Compliance e Direito do Trabalho): interpretação normativa, revisão de políticas internas e mitigação de riscos legais;
- Psicologia e Medicina do Trabalho: avaliação de saúde mental, programas de apoio e integração com o PCMSO;
- Engenharia de Segurança e SST: atualização do PGR, identificação de fatores ambientais e análise ergonômica;
- Recursos Humanos: pesquisas de clima, treinamentos, escuta ativa e promoção de práticas saudáveis de gestão.
Ao reunir essas expertises, a empresa reduz sua exposição a passivos e melhora a governança, promovendo um ambiente organizacional mais saudável e produtivo.
Repercussões jurídicas e fiscalizatórias
Embora o novo texto da norma estabeleça um período inicial sem imposição de multas (até maio de 2026), a norma já está em vigor e pode ser utilizada como base para ações trabalhistas e inspeções do Ministério do Trabalho. Além disso:
- A ausência de medidas preventivas pode caracterizar conduta negligente do empregador;
- A empresa pode ser responsabilizada com base na teoria da responsabilidade objetiva (art. 927, parágrafo único, do Código Civil), caso seja considerada uma atividade de risco;
- A jurisprudência atual já reconhece o dano existencial e moral decorrente de práticas organizacionais abusivas.
Como as empresas podem se proteger?
Algumas medidas estratégicas incluem:
- Atualização do PGR com participação de equipe multidisciplinar;
- Revisão das políticas internas de compliance, ética e conduta;
- Criação de comitês internos ou grupos de trabalho para acompanhamento da saúde mental;
- Treinamentos periódicos sobre riscos psicossociais, assédio, respeito à diversidade e liderança humanizada;
- Implementação de canal de denúncia e escuta ativa, com garantia de anonimato e apuração eficaz.
Conclusão
A alteração da NR-1 representa uma importante evolução na forma como a legislação trabalhista brasileira trata a saúde mental e os riscos invisíveis no ambiente de trabalho. Mais do que uma obrigação legal, a gestão dos riscos psicossociais deve ser compreendida como uma estratégia de prevenção, produtividade e sustentabilidade organizacional.
Empresas que se anteciparem à exigência e estruturarem seus programas com base em boas práticas jurídicas, técnicas e humanas estarão mais protegidas contra passivos trabalhistas e também contribuirão para um ambiente de trabalho mais saudável e ético.
Rocheli Kunzel,
OAB/RS 81.795.