O mês de abril é tradicionalmente marcado pela campanha Abril Verde, uma mobilização nacional voltada à conscientização sobre a importância da prevenção de acidentes de trabalho e doenças ocupacionais. Mais do que um símbolo, o laço verde que representa a campanha é um chamado à responsabilidade coletiva — de empresas, trabalhadores, entidades públicas e da sociedade civil — pela promoção de ambientes laborais saudáveis, seguros e dignos.
Nos últimos anos, o debate em torno da saúde e segurança no trabalho (SST) tem evoluído de maneira significativa, incorporando novos paradigmas que ultrapassam os limites da integridade física. Um dos temas que ganha centralidade nesse contexto é a saúde mental no ambiente de trabalho, uma dimensão antes invisibilizada, mas hoje reconhecida como essencial para a proteção integral do trabalhador.
O marco normativo: da prevenção física à saúde emocional
Dois instrumentos normativos recentes impulsionaram essa transformação:
- A Lei nº 14.457/2022, que institui o Programa Emprega + Mulheres, trouxe importantes avanços na promoção de um ambiente de trabalho mais equitativo, ao tratar de medidas de combate ao assédio e incentivo à conciliação entre vida profissional e pessoal.
- A atualização da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), que trata das disposições gerais da SST, passou a incluir expressamente os riscos psicossociais como elementos integrantes do Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO).
Essas normas, somadas a orientações da Organização Internacional do Trabalho (OIT), apontam para um novo modelo de gestão: mais abrangente, mais ético e atento às relações humanas que permeiam o cotidiano corporativo.
O que são riscos psicossociais e por que eles importam
Os riscos psicossociais são definidos como fatores organizacionais, relacionais ou de gestão que podem afetar negativamente o bem-estar mental e emocional dos trabalhadores. Entre os principais exemplos, destacam-se:
- Pressão excessiva por metas e resultados;
- Clima organizacional tóxico ou hostil;
- Assédio moral e sexual;
- Falta de reconhecimento e de perspectiva de crescimento;
- Jornadas extensas e desrespeito aos intervalos legais;
- Isolamento, sobrecarga e ausência de apoio social.
Ignorar esses fatores compromete não apenas a saúde individual, mas também a produtividade, o clima interno e a reputação da empresa. Já reconhecidos como causas frequentes de burnout, transtornos de ansiedade, depressão e outros quadros clínicos, os riscos psicossociais impactam diretamente os indicadores de desempenho, absenteísmo e turnover.
O papel das Empresas na prevenção: muito além da conformidade
Com a incorporação dos riscos psicossociais ao GRO, empresas de todos os portes passam a ter o dever de mapear, avaliar e mitigar esses riscos de maneira sistemática. Isso significa:
- Integrar a saúde mental à matriz de riscos ocupacionais;
- Capacitar lideranças para identificar sinais de sofrimento psíquico;
- Revisar políticas internas com foco no bem-estar emocional;
- Fortalecer canais de escuta ativa e acolhimento psicológico;
- Implantar programas de saúde emocional e suporte psicossocial contínuo.
A mudança não é apenas documental ou técnica: trata-se de transformar a cultura organizacional, priorizando ambientes empáticos, colaborativos e emocionalmente seguros.
Saúde mental é segurança do trabalho
Durante décadas, a Saúde e Segurança no Trabalho (SST) esteve atrelada quase exclusivamente ao uso de equipamentos de proteção individual (EPIs) e ao controle de acidentes físicos. Esse modelo, embora necessário, tornou-se insuficiente diante das novas realidades do trabalho, marcadas por intensificação das tecnologias e cobrança por alta performance; hiperconectividade e trabalho remoto; desequilíbrio entre vida pessoal e profissional; adoecimento mental silencioso, mas progressivo.
Reconhecer que saúde mental também é segurança do trabalho é um passo fundamental para atender aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da valorização do trabalho como base da ordem social.
Oportunidade para ação estratégica no Abril Verde
A campanha do Abril Verde deve ser encarada não apenas como um momento de conscientização, mas como ponto de partida para ações estruturantes dentro das empresas.
Algumas práticas recomendadas incluem:
- Realização de diagnósticos organizacionais com foco em clima, liderança e saúde emocional;
- Promoção de treinamentos sobre prevenção de assédio, escuta ativa e empatia no trabalho;
- Implementação de comitês de diversidade, inclusão e bem-estar emocional;
- Atuação da CIPA com foco em riscos psicossociais, conforme preveem a NR-1 e a Lei 14.457/2022;
- Criação de programas contínuos de acolhimento psicológico e suporte emocional, internos ou terceirizados.
Empresas que investem em saúde mental constroem uma marca empregadora mais atrativa, evitam litígios trabalhistas, reduzem afastamentos e aumentam a retenção de talentos. Mais do que isso: contribuem para um modelo de desenvolvimento sustentável e humano.
Um compromisso ético, legal e estratégico
O Abril Verde de 2025 nos convida a repensar o que significa “segurança no trabalho”. A saúde mental deixou de ser um tabu ou um tema periférico. Hoje, ela é parte essencial da estratégia empresarial, do cumprimento legal e do cuidado com o capital humano.
Implementar o Gerenciamento de Riscos Ocupacionais com foco em fatores psicossociais é uma exigência normativa, mas também um ato de respeito com aqueles que constroem o dia a dia das organizações.
Cuidar da saúde mental no trabalho é promover segurança, dignidade e respeito — não apenas em abril, mas todos os dias do ano.